Golpe do boleto falso: entenda quem arca com o prejuízo

É inegável que o surgimento de novas tecnologias traz uma série de benefícios à sociedade. No entanto, se tais recursos não forem utilizados de forma ética, estamos todos expostos a uma série de golpes muito difíceis de serem percebidos. Escritório Xerfan Advocacia S/S traz dicas para não cair em golpes.

Imagine a seguinte situação: você está pagando o financiamento do seu carro junto a um banco. Finalmente, depois de muito esforço, você consegue juntar dinheiro para providenciar a quitação antecipada do valor pendente. Acessa o site oficial do banco para emitir o boleto, e o site direciona você a um número de whatsApp para atendimento. O atendente envia o boleto, você imprime e leva até o banco para pagar no caixa de atendimento, com a transação sendo autorizada pelo gerente.

Algum tempo depois, você entra em contato com o banco para solicitar o recibo de quitação e, para sua surpresa, é informado de que as parcelas continuam em aberto e com prestações já vencidas. Ou seja, você pagou um boleto falso. Diante disso, o banco se recusa a reconhecer a quitação do financiamento, alegando que a responsabilidade do ocorrido é sua.

Apesar de surreal, isso aconteceu em Mirassol, no interior de São Paulo. O consumidor vítima da fraude chegou até a perder o processo em primeira instancia, sob o fundamento de que ele teria agido em desacordo com as normas mínimas de segurança informadas pelas instituições financeiras ao efetuar o pagamento, por não ter conferido o nome do beneficiário do boleto.

No entanto, essa decisão foi reformada em segunda instância, pela 12ª câmara de Direito Privado do TJ/SP. Na decisão, o relator deu provimento ao recurso do consumidor, condenando o banco a ressarcir o valor pago pelo consumidor, acrescido de juros de 1% ao mês e de correção monetária, por entender que o evento danoso foi um fortuito interno, de responsabilidade do banco.

Fortuito interno é algum acontecimento que tem a ver com a organização da empresa e que guarda relação com os riscos da atividade que ela exerce, de maneira que a empresa não pode se eximir da responsabilidade caso esse acontecimento venha a trazer prejuízos ao consumidor.

Essa compreensão do relator veio a partir do fato de que a fraude teve início a partir do site oficial do banco, em que um terceiro fraudador teve acesso ao sistema do banco, acessasse os dados relativos ao financiamento feito pelo consumidor e conseguisse inclusive direcioná-lo ao atendimento via WhatsApp para, enfim, concretizar o golpe. Para o relator, a fraude partiu de pessoas com acesso a esses dados a partir do sistema interno do banco, caracterizando, portanto, o fortuito interno.

Uma vez que não houve a comprovação de que a culpa foi exclusiva do consumidor, prevalece o entendimento da súmula 479 do Superior Tribunal de Justiça, que preconiza que “as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito das operações bancárias”.

É fato que ao consumidor compete o dever de cautela. Mas todos estamos sujeitos aos ataques cibernéticos que, com o passar do tempo, vão ficando cada vez mais sofisticados e sutis, e para que o consumidor fosse responsabilizado pelo erro era preciso que tivesse culpa exclusiva pelo ocorrido, conforme prevê o Código de Defesa do Consumidor em seu art. 14, §3º, inciso II. Cabia ao banco, diante da hipossuficiência do consumidor, comprovar essa culpa exclusiva, o que não aconteceu, na visão do Tribunal de Justiça de São Paulo.

Ou seja, caso o banco, ou qualquer outra empresa ou fornecedor, não consiga provar que o erro do ocorrido é atribuível exclusivamente ao consumidor, ele pode sim ser responsabilizado pelos danos gerados por fortuito interno em relação as fraudes.

Apesar disso, o acontecimento serve de alerta para os consumidores. Diante da iminência de realizar algum pagamento ou realizar alguma transferência, é de extrema importância conferir os dados de quem está cadastrado como recebedor daquele valor. Se pessoa física, conferindo o CPF e o nome completo cadastrado. Se pessoa jurídica, conferindo o CNPJ e o nome da instituição.

Caso exista alguma divergência em relação aos dados indicados, o ideal é sempre confirmar com a empresa ou fornecedor destinatário da cobrança. Também se recomenda sempre estar atento as regras de cobrança das instituições bancárias. Hoje é comum vermos constantes avisos em sites ou nos aplicativos dos bancos informando o consumidor sobre algumas práticas que não são adotadas pela instituição, como ligar para o consumidor para confirmar uma compra recusada.

Apesar do ocorrido, os canais oficiais de comunicação dos bancos continuam sendo a principal fonte de informação sobre as condutas adotadas por estes na relação com o consumidor. No entanto, caso o consumidor tenha algum problema relacionado a fraudes bancárias, é necessário procurar um advogado de sua confiança para obter apoio jurídico, inclusive voltado para a coleta de provas aptas a evidenciar a boa-fé do consumidor e respaldá-lo da melhor forma frente as instituições financeiras.

João Victor, advogado especialista do escritório Xerfan Advocacia S/S, completa: “O nosso escritório, por exemplo, sempre alerta seus clientes contra fraudes informando que seus advogados não fazem contatos via Whatsapp para cobranças de honorários ou outras despesas”